Niterói vive uma comédia surreal. Há dois bairros vizinhos, Rio do Ouro e Várzea das Moças, que praticamente são incomunicáveis. Ambos não têm avenida de ligação direta entre si e dependem de duas vias problemáticas para se ligarem.
Uma das vias é uma estrada de carroça, entre as ruas Senador Fernandes da Cunha, no Rio do Ouro, e Jean Valenteau Moulliac, em Várzea das Moças, que tem trechos sem asfalto e com via tão estreita que não dá para passar dois carros no mesmo lugar.
Outra das vias é a Rodovia RJ-106, que liga Tribobó - bairro bimunicipal de Niterói e São Gonçalo - a Maricá e Região dos Lagos. Apesar da envergadura da estrada, que é uma rodovia estadual, e ligar uma grande quantidade de municípios, em Niterói a RJ-106 goza da "confortável" condição de "avenida de bairro", causando sobreposição de função na rodovia.
O dado surreal se dá por conta do conformismo extremo entre autoridades, técnicos e até mesmo a opinião pública, que não mexe um dedo para digitar no computador um pingo de indignação contra a situação surreal.
O conformismo é tanto que chega-se a uma conclusão idiota sobre a "desnecessidade" de uma avenida própria ligando Rio do Ouro a Várzea das Moças. Muitos acham que os dois bairros não precisam de nova avenida "porque já tem a RJ-106". É muito cretinismo: é como alguém dizer "nós não precisamos de solução, porque o problema já nos satisfaz completamente".
A coisa está tão complicada que, no trecho de Várzea das Moças, os ônibus que saem do entorno da Av. Ewerton Xavier e Av. Plínio Gomes de Matos Filho, na RJ-106, precisam pegar um trecho no sentido Maricá e encarar um retorno, sendo obrigado a mudar de faixa, prejudicando o trânsito, sobretudo automóveis que já aceleram na rodovia para se dirigirem à Região dos Lagos.
Não há mergulhões que possam escoar o trânsito de Rio do Ouro e Várzea das Moças para a RJ-106 no sentido Tribobó. E a falta de avenida própria que possa ligar os dois bairros sem depender da rodovia estadual traz um sério problema de mobilidade urbana e fluidez no trânsito, com a sobreposição de funções na RJ-106.
O mais surreal é que o DER-RJ, órgão do governo do Estado do Rio de Janeiro, que deveria mais se preocupar com a situação, se limita apenas a oferecer a RJ-106 para as estradas a serem privatizadas em breve. Mas o órgão não mexe um dedo para resolver o problema de sobreposição de funções na rodovia, que não pode se rebaixar a avenida de bairro no trecho de Niterói, prejudicando as demandas de outros municípios.
Outra coisa a destacar é que a Prefeitura de Niterói só intervém nos bairros para recapear o asfalto, investindo até no processo complexo da "patrolagem", que é uma espécie de asfaltamento mais cuidado, com preparação de várias camadas de solo para receber um asfalto mais resistente.
As áreas de Rio do Ouro, Várzea das Moças e outros bairros de Niterói, São Gonçalo e Maricá já são abandonadas pelo poder público. Mas lembrar de problemas de infraestrutura, mobilidade urbana, saneamento, iluminação, segurança etc não excluem a construção da nova avenida entre os dois bairros niteroienses, necessidade que se tornou urgente após a inauguração da estrada Cafubá-Charitas, entre a Região Oceânica e o Saco de São Francisco.
Isso porque há uma preocupação de se repetir o vexame da Cafubá-Charitas, um projeto que levou sete décadas para ser implantado, diante da indiferença dos niteroienses presos em suas zonas de conforto (ou desconforto, pela aceitação servil e bovina a transtornos graves).
Durante anos, a opinião pública niteroiense se resignou com a travessia, entre a R.O. e São Francisco, pelo longo caminho pelo Largo da Batalha. Não havia um pio sobre esse problema e todos perdiam tempo, felizes, em seus veículos, com tão longa travessia.
Estrada ligando Piratininga e São Francisco (na altura do Imbuí, vizinho a Charitas) até havia, mas ela tinha como barreira uma área militar, o que fazia com que se apelasse para ruas residenciais em longa e trabalhosa travessia.
Hoje o problema se repete entre Rio do Ouro e Várzea das Moças. O surreal e ridículo conformismo com a falta de avenida própria "porque já tem a RJ-106" se prolonga e cabe, pelo menos, denunciarmos a opinião pública conformista, porque na verdade ela se torna um arremedo de opinião pública, servil ao establishment político-administrativo dominante.
Com isso, a mobilidade urbana é apenas uma quimera no entorno da RJ-106, diante do atolamento de niteroienses influentes que, com suas páginas noticiosas nas redes sociais, pelo menos deveriam se indignar com a falta de avenida própria ligando dois bairros vizinhos, "isolados" entre si.
No entanto, espera-se que não precisemos aguardar mais de 70 anos para que os niteroienses tenham a consciência da necessidade de uma nova avenida. Repetir o vexame da Cafubá-Charitas será demais para Niterói, oficialmente considerada a quarta melhor do país em índice de desenvolvimento humano. Só que IDH não cai do céu, viu?
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