Um modelo de transporte que se fundamenta pela tirania do horário dos ônibus numa cidade congestionada, na dupla função do motorista-cobrador, na pintura padronizada nos ônibus, nos veículos superlotados devido à redução de frotas em circulação e no esquartejamento de itinerários visando forçar o Bilhete Único tem mais um motivo que comprova o esgotamento e o declínio irrecuperável deste sistema implantado por Eduardo Paes em 2010.
Mais preocupado em manter um sistema de ônibus tecnocrático, com as caraterísticas acima, preferindo o sensacionalismo do que a funcionalidade e o interesse público, esse sistema, que tanto usa e abusa do verbete "mobilidade urbana", pode representar um processo judicial contra a própria Prefeitura do Rio de Janeiro.
Isso porque, no acidente que, poucos dias atrás, atropelou e matou uma jovem ciclista, Júlia Rezende, de apenas 19 anos, no bairro de Botafogo, Zona Sul do Rio de Janeiro, sua morte foi facilitada ainda pelo desnível do asfalto, indicando o descaso do poder público em renová-lo periodicamente e de forma adequada a garantir a segurança dos cidadãos.
Peritos já reconstituíram o trágico acidente, cujo atropelamento foi causado por um ônibus da Intersul (não foi creditada a empresa). Se for comprovado tecnicamente o problema do asfalto, a prefeitura poderá ser processada, juntamente com a Secretaria de Transportes, que em sua maior parte dos governos de Eduardo Paes teve como titular o tecnocrata Alexandre Sansão.
PINTURA PADRONIZADA ACABA RESPONSABILIZANDO A PREFEITURA
O que chama a atenção também é que a própria pintura padronizada acaba revelando a responsabilidade criminal da Prefeitura do Rio de Janeiro. É possível que esse aspecto não seja considerado juridicamente, num tempo de irregular performance da Justiça no nosso país, mas o vínculo de imagem das frotas de ônibus ao governo municipal atenua a responsabilidade dos empresários e aumenta a do prefeito e do secretário de Transportes.
Os ônibus exibem a concepção visual determinada pela Prefeitura. Há casos em que o governo estadual é que dita a padronização visual. A ênfase nas informações apresentadas está no logotipo da prefeitura, através da expressão "Cidade do Rio de Janeiro" e seu brasão correspondente.
O nome da empresa aparece em menor destaque, junto ao nome do consórcio, que aparece em tamanho um pouco maior. Essa representação visual dá à Prefeitura do Rio de Janeiro maior responsabilidade pelas frotas de ônibus do que as próprias empresas operadoras.
É por causa disso que as empresas estão sucateando as frotas. Como elas não apresentam suas identidades visuais próprias, mas uma identidade comum determinada pela Prefeitura, esta se torna a responsável simbólica das frotas e obtém vínculo de imagem.
Engana-se que esse vínculo de imagem envolve relações simplórias de disciplina ou estética. Se a pintura padronizada tira o vínculo de imagem das empresas de ônibus operadoras, transferindo esse vínculo à secretaria de Transportes correspondente (no caso a prefeitura carioca), é este poder público que acaba tendo responsabilidade maior pelos transtornos causados pelo sistema de ônibus.
Diante disso, a Prefeitura do Rio de Janeiro torna-se, na prática, duplamente responsável pela morte da ciclista, não bastasse o agravante do sistema de mobilidade urbana carioca não dar o devido valor às ciclovias (são muito poucas no Rio).
Sua responsabilidade envolve tanto a falta de cuidado com o asfalto, que possibilitou a queda da ciclista e o trágico atropelamento, quanto pela responsabilidade simbólica do ônibus que a atropelou, uma vez que, embora seja de uma empresa particular, ela está vinculada ao consórcio Intersul, organizado pela Prefeitura, e cuja pintura padronizada simboliza justamente o governo que organiza esse sistema de Transportes.
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