A prisão, na manhã do último dia 10 de dezembro, do prefeito de Niterói, Rodrigo Neves, surpreendeu até quem não gostava dele. Embora feita sob os critérios tendenciosos e irregulares da Operação Lava Jato, que aqui opera no seu desdobramento chamado Operação Alameda, a prisão desmoraliza todo um esquema de politicagem envolvendo ônibus e simbolizado pela pintura padronizada que confunde os passageiros e oculta as empresas deficitárias.
Rodrigo Neves não implantou os tais "ônibus iguaizinhos". Seu antecessor, Felipe Peixoto - que pode ser conhecido jocosamente como Felipe Transnit - , implantou o esquema, sob a alegação de que "era necessário tirar o vínculo de imagem das empresas". Sabe-se que a medida, na verdade, corrompe o processo de concessão de serviço de ônibus, porque a Prefeitura de Niterói concede as linhas mas fica com a supremacia de imagem, o que é desvantajoso para os passageiros.
A prisão de Rodrigo Neves se deu através de uma delação premiada do empresário Marcelo Traça, também preso pela operação e que já esteve em cargos de comando na FETRANSPOR e SETRERJ. Segundo o delator, Rodrigo e e o ex-secretário municipal de Obras e Infraestrutura e ex-conselheiro de administração da Nittrans, Domício Mascarenhas de Andrade, integravam um esquema de corrupção.
Os dois faziam parte de uma organização criminosa que solicitou vantagens indevidas e desviou recursos públicos decorrentes dos contratos de concessão em proveito próprio. Rodrigo e Domício atuavam junto com os empresários João Carlos Felix Teixeira, presidente e sócio-administrador do Consórcio Transoceânico, e João dos Anjos Silva Soares, presidente do consórcio Transnit. Teixeira é ligado à Viação Pendotiba e Soares, à Auto Lotação Ingá.
Marcelo Traça também intermediava os contatos. As reuniões ocorriam desde 2014 até poucos dias atrás, e eram realizadas em restaurantes, shoppings e na própria sede da SETRERJ, que os envolvidos conheciam como "alameda".
Conforme a denúncia, a denúncia, os empresários exerciam a função de recebimento e arrecadação, de cada empresa integrante dos consórcios Transoceânico e Transnit, os valores relativos ao percentual ilícito para repasse aos agentes públicos. Eles faziam a transferência de pacotes de dinheiro vivo para uma mochila que era levada por Domício, considerado braço financeiro do esquema. Traça, por sua vez, fazia a intermediação entre os processos político e econômico.
Outro empresário que prestou depoimento foi Renato Pereira, outro réu colaborador, ao qual, segundo sua denúncia, o prefeito Neves pediu o pagamento de despesas de campanha da sua reeleição por meio de caixa dois. Pereira ainda afirmou que Domício teria mencionado a possibilidade de efetuar pagamentos utilizando o dinheiro da propina arrecadado junto aos empresários do ramo de transportes da cidade.
Segundo apontam os cálculos dos investigadores, entre os anos financeiros de 2014 e 2018, o município de Niterói, a título de gratuidade, pagou o montante de R$ 28.857.761,66 em favor do consórcio Transoceânico e R$ 26.054.058,01 em favor do consórcio Transnit.
Do percentual de retorno de 20% praticado a título de propina aplicável sobre o valor total dos recursos públicos liquidados e pagos, a organização criminosa integrada pelos denunciados recebeu, no intervalo temporal de apenas quatro exercícios financeiros, a quantia de pelo menos R$ 10.982.363,93, desviada do erário do município.
Os denunciados estão sujeitos às penas do artigo 2 §2º, II e IV da Lei 12.850/13 e dos artigos 317 e 333 do Código Penal, respectivamente, pelos crimes de organização criminosa e contra a Administração Pública, sobretudo, corrupção ativa e passiva.
O Ministério Público do Rio de Janeiro também requereu, junto à Justiça, a fixação de multa para reparação dos danos causados de, no mínimo, R$ 10.982.363,93. O Tribunal de Justiça ainda acolheu requerimento ministerial e determinou a suspensão do exercício das funções públicas dos acusados Rodrigo Neves e Domício Mascarenhas.
Atualmente exerce a Prefeitura de Niterói o presidente da Câmara Municipal, Paulo Bagueira, em governo interino. O caso está sob investigação e ainda se analisará o futuro político de Rodrigo Neves. O MP-RJ também investiga se o esquema de corrupção também está relacionado com os aumentos das passagens de ônibus, atualmente com valor padrão de R$ 3,90.
A lição para esse episódio traz mais uma vez o problema que é o sistema tecnocrático de ônibus, em que o poder político e os empresários de ônibus atuam de forma promíscua, com secretários de Transportes concentrando poder no serviço enquanto o empresariado obtém vantagens políticas abusivas. Perdem os passageiros, num esquema em que uma mesma pintura esconde as identidades das empresas, para evitar ou dificultar o reconhecimento do povo.
(Com informações do jornal O Fluminense)
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