A transição promovida pela SPTrans para substituir a Transwolff e a UPBus por outras empresas pode fazer com que o modelo de transporte coletivo, lançado em Curitiba e instalado em São Paulo através de um prefeito ligado às elites do poder financeiro, pareça dotado de sustentabilidade administrativa e muito bom-mocismo. Mas reflete o problema do "baile de máscaras" sobre roda servir de álibi para o crime organizado.
Para quem não está por dentro do assunto, vamos falar rapidamente que as duas empresas de ônibus, Transwolff e UPBus, atuantes na Zona Sul e Zona Leste, respectivamente, na capital paulista, foram denunciadas por suposta associação ao crime organizado, representando negócios para "lavar dinheiro" da facção PCC (Primeiro Comando da Capital), um dos principais grupos criminosos em atuação em várias partes do Brasil.
As denúncias fizeram com que as duas empresas tivessem suas operações canceladas enquanto suas frotas, mesmo mantendo os logotipos das duas ex-operadoras, passaram a ser operadas pela Prefeitura de São Paulo. Até os rodoviários que atuaram nas duas empresas foram mantidos.
A Sancetur foi designada para tomar o lugar da Transwolff e a Alfa Rodobus, da UPBus. Integrantes de uma cooperativa que atuava nas linhas da Transwolff chegaram a protestar contra a escolha da Sancetur. A Alfa Rodobus já atua no sistema de ônibus de São Paulo e, durante um breve tempo, chegou também a operar no sistema de transporte de Magé, no Estado do Rio de Janeiro.
O desfecho do caso não garante a transparência do sistema de ônibus marcado pela pintura padronizada. Afinal, foi justamente a pintura unificada que favoreceu a atuação criminosa da Transwolff e da UPBus, e o que as autoridades fizeram não assegura o sucesso desse modelo autoritário de transporte criado por Jaime Lerner, prefeito de Curitiba, no auge da ditadura militar.
Nesse modelo de transporte, que faz os secretários de transporte, municipais e estaduais, terem um poder concentrado sobre as empresas de ônibus - o que não resolve o problema, pois ter poder demais não é necessariamente ser mais honesto, vide a própria ditadura militar que sempre favoreceu os detentores do poder financeiro, como empresários e banqueiros - , o público tem a dificuldade de identificar as empresas de ônibus, pois não há permissão destas apresentarem suas respectivas identidades visuais.
A identificação de cada empresa é praticamente um segredo mantido pelas autoridades do poder público. A exibição minúscula dos nomes das empresas não adianta muito, assim como as "sopas de letrinhas" dos códigos alfanuméricos, o que faz com que o cidadão que trabalha e vive no corre-corre tenha grande risco de embarcar no |ônibus errado.
A ameaça do prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes, em esconder novamente as empresas de ônibus da população com mais uma licitação de fachada, causa muita apreensão. Além da nova licitação envolver favorecimentos e politiagens, há o forte risco do crescente empreendedorismo clandestino das milícias, que já monopolizam serviços nas favelas e até em parte das residências suburbanas comuns no Grande Rio, penetrar nas empresas de ônibus.
Quando havia a Trans1000 atuando na Baixada Fluminense, os rumores de padronização visual do DETRO, além de transformar o sistema num complicado processo burocrático, poderia favorecer a empresa de Mesquita que, com perfil extremamente oposto à Viação Nossa Senhora da Penha, da mesma cidade, no que se refere à organização da frota, teria o mesmo visual, se escondendo sob o prestígio da concorrente diante da confusão que isso pode causar aos passageiros comuns.
Em Brasília, já houve denúncias de infiltração de empresas de ônibus piratas no sistema de ônibus municipal. Também houve uma denúncia de reencarroçamento ilegal, com um ônibus modelo Marcopolo Torino 2007 sendo reencarroçado de um modelo Nicola Ouro 1959 que já circulava na capital federal quando ela ainda estava em fase final das obras.
Embora São Paulo e cidades como Fortaleza procurem se empenhar em manter uma qualidade no sistema de õnibus, mesmo sob o "baile de máscaras" da pintura padronizada, a medida de colocar diferentes empresas de ônibus sob uma mesma pintura é injustificável. Afinal, há opções de identificação de consórcios através de tarjas colocadas nos ônibus ou por letras colocadas em quadrados coloridos.
O que podemos concluir é que, se com a permissão das identidades visuais estilizadas de cada empresa, isso não faz com que a operadora do sistema de ônibus se tornasse "santa", a pintura padronizada agrava isso, pois, quando a população é dificultada a reconhecer uma empresa de ônibus dentro daquela bagunça organizada da uniformização de pinturas, é aí que a corrupção se torna mais evidente.
A atuação das autoridades para resolver esses problemas tem caráter paliativo e não traz qualquer vantagem real para o modelo marcado pelo visual único nas empresas de ônibus. Os passageiros, no seu corre-corre diário, sempre terão dificuldade para identificar qual a empresa de ônibus que opera em sua linha. Portanto, a transparência está sempre fora de circulação nesse modelo de administração dos ônibus de uma cidade ou Estado.
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